Simone de Beauvoir nasceu em 09 de janeiro de 1908, em Paris, na França. Mais tarde, após frequentar um colégio católico, estudou matemática, literatura, latim e filosofia. Assim, de 1929 a 1943, foi professora de Filosofia. Então iniciou sua carreira literária com a publicação do romance A convidada. 6i1a1z
A escritora, que faleceu em 14 de abril de 1986, era ateia, feminista, defensora do amor livre e existencialista. Seus romances metafísicos são de caráter filosófico e mostram, de forma realista, a experiência cotidiana dos personagens. No entanto, sua obra mais famosa é teórica e intitulada O segundo sexo.
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Simone de Beauvoir nasceu em 09 de janeiro de 1908, em Paris, na França. Era integrante de uma família burguesa. Com três anos de idade, aprendeu a ler. Até os 17, ela estudou no Curso Désir, um estabelecimento privado e católico de ensino, mas, já mostrando independência intelectual, a escritora se tornou ateia aos 14 anos.
Com a falência de seu avô materno, a família da escritora perdeu um pouco do poder financeiro que possuía. Ainda assim, após adquirir o bacharelado, em 1925, por estímulo do pai, Beauvoir continuou a estudar.
Ela estudou matemática, literatura e latim, mas tinha grande interesse em filosofia, e foi na Universidade de Paris que ela conheceu o jovem filósofo Jean-Paul Sartre (1905-1980). Em 1929, a escritora adquiriu o certificado de professora de Filosofia. A partir daí, ou a lecionar em Paris, em seguida, em Marseille, enquanto Sartre se tornou professor no Liceu de Le Havre.
Temeroso de perder contato com a moça, ele a pediu em casamento, mas Beauvoir se recusou, pois já se mostrava contrária ao casamento burguês. Ela então ou a trabalhar como professora em Rouen. Voltou definitivamente a Paris em 1936, onde atuou como professora até o ano de 1943.
Nesse ano, estreou na literatura com seu romance A convidada. Em 1945, fundou, com Sartre (com quem mantinha um relacionamento amoroso aberto) e outros intelectuais, a revista Os Tempos Modernos, de caráter existencialista. Após a guerra, a filósofa, declaradamente comunista, fez várias viagens pelo mundo, relatadas mais tarde em suas memórias.
Quando publicou, em 1949, sua obra teórica O segundo sexo, importante livro feminista, Simone de Beauvoir ou a ser conhecida mundialmente. A obra gerou reações positivas, negativas e debates. O Vaticano incluiu o livro em seu Index, uma relação de obras proibidas. Em 1954, a autora recebeu o famoso Prêmio Goncourt, pelo seu romance Os mandarins.
Dois anos depois, ela e Sartre romperam com o comunismo soviético, mas mantiveram a postura de intelectuais de esquerda. Assim, depois de escrever suas memórias, ela faleceu em 14 de abril de 1986, em Paris, e foi sepultada no cemitério de Montparnasse, ao lado de Sartre, falecido anos antes.
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O romance A convidada tem traços autobiográficos e narra o triângulo amoroso entre Françoise, Pierre e Xavière. Tal relação é semelhante à que foi vivida por Simone de Beauvoir, Sartre e Olga Kosakievicz (1915-1983). A obra mostra então uma alternativa de relacionamento contrária à monogamia burguesa.
A princípio, Françoise e Pierre vivem uma relação amorosa quase inquebrantável, apesar de terem um relacionamento aberto. Até que a jovem Xavière entra na história, torna-se amiga de Françoise e desperta o interesse sexual de Pierre, o que provoca o ciúme de Françoise.
A história se a em Paris, no final dos anos 1930. Françoise Miquel tem 30 anos. Pierre Labrousse, seu amante, tem mais ou menos a mesma idade. Ambos são intelectuais. Já Xavière Pagès é uma jovem estudante que é seduzida por Pierre. Mais tarde, Xavière dorme com Gerbert, o que provoca ciúme em Pierre.
Para complicar a situação, Françoise também dorme com Gerbert, o que provoca o ciúme de Xavière. Dessa forma, o enredo vai se construindo por meio das relações afetivas e intelectuais entre esses personagens. Xavière, “a convidada”, que também poderia ser chamada de “a intrusa”, caminha para um surpreendente final trágico.
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Simone de Beauvoir escreveu tanto textos teóricos quanto literários. Os ensaios da autora têm uma perspectiva existencialista e feminista. Eles discutem questões como ética, política, situação, ambiguidade humana, alteridade, ação individual, liberdade, objetificação e opressão.
Seus textos literários, tanto os romances quanto as memórias, também têm caráter filosófico. Neles, estão presentes discussões sobre a alteridade e a ambiguidade do sujeito. Beauvoir escrevia o chamado “romance metafísico”. A romancista e filósofa entendia a metafísica como uma atitude, bem aos moldes existencialistas.
Defendia que a essência humana (a subjetividade) está no próprio indivíduo e não em uma força mística exterior a ele. Seus textos literários representam a experiência metafísica humana com base na vivência cotidiana de seus personagens. O romance metafísico explicita a experiência individual do personagem.
Desse modo, lança um olhar sobre a realidade, onde a experiência humana tem lugar. Busca então mostrar a relação entre o personagem e o mundo em que ele vive, além de seu conflito com a realidade, consigo mesmo e com o outro. Dessa forma, Simone de Beauvoir pode ser considerada uma autora pós-modernista.
Simone de Beauvoir, além de romancista, era também filósofa. Seus textos teóricos e literários revelam seus pensamentos feministas em torno da condição da mulher na sociedade, do amor livre e do existencialismo. A autora considerava que os relacionamentos amorosos construídos em uma base tradicional romântica apenas acarretam o sofrimento dos indivíduos envolvidos.
Nesse tipo de relacionamento, existe a anulação do indivíduo, principalmente o feminino, em prol do casal. Para ela, esse tipo de relação acaba sendo uma obrigação imposta principalmente às mulheres, o que as impede de experimentar o amor livre. Além disso, ela aponta a objetificação, facilitada pela submissão feminina.
Dessa forma, a mulher, como objeto, não pode ser sujeito de sua existência. Ela é educada para supervalorizar a vida amorosa e para abrir mão do todo. Essa vida baseada no amor leva a mulher a uma frustração diante de homens que nunca poderão corresponder a suas idealizações.
Para a filósofa, o amor verdadeiro deve se fundar “no reconhecimento recíproco de duas liberdades”, sem abdicações ou mutilações. Assim, o amor seria, para ambos, “uma revelação de si mesmo pelo dom de si e o reconhecimento do universo”.|1| Dessa maneira, Simone de Beauvoir se tornou uma das principais representantes do movimento feminista.
Ela questionava os papéis sociais impostos às mulheres e aos homens, e mostrava as desigualdades entre os sexos, a forma como a mulher é considerada, em importância social, o “segundo sexo”:
Um dos mal-entendidos que meu livro [O segundo sexo] suscitou foi que se pensou que nele eu negava qualquer diferença entre homens e mulheres: ao contrário, ao escrevê-lo, medi o que os separa; o que sustentei foi que essas dessemelhanças são de ordem cultural, e não natural. Contei sistematicamente como elas se criam, da infância à velhice; examinei as possibilidades que este mundo oferece às mulheres, as que lhes são recusadas, seus limites, suas oportunidades e faltas de oportunidades, suas evasões, suas realizações.|2|
O feminismo de Simone de Beauvoir é considerado existencialista, como aponta a própria autora:
A perspectiva que adotamos é a da moral existencialista. Todo sujeito coloca-se concretamente através de projetos como uma transcendência; só alcança sua liberdade pela sua constante superação em vista de outras liberdades; não há outra justificação da existência presente senão sua expansão para um futuro indefinidamente aberto. Cada vez que a transcendência cai na imanência, há degradação da existência “em si”, da liberdade em facticidade; essa queda é uma falha moral, se consentida pelo sujeito. Se lhe é infligida, assume o aspecto de frustração ou opressão.|3|
Por fim, vale lembrar que o existencialismo está fundado na reflexão sobre a ação, as escolhas e a liberdade. Ele questiona a própria existência humana e o que é ser um humano. Pensa sobre as formas como o ser humano se relaciona com a realidade e sobre a força do determinismo e do condicionamento. Porém, na teoria existencialista, a existência precede a essência, que deve ser construída por cada um de nós.
A seguir, vamos ler algumas frases de Simone de Beauvoir retiradas de suas obras O segundo sexo, Memórias de uma moça bem-comportada, Os mandarins e Todos os homens são mortais:
“O casal feliz que se reconhece no amor desafia o universo e o tempo; basta-se, realiza o absoluto.”
“Toda criança que nasce é um deus que se torna homem.”
“Não se nasce mulher, torna-se mulher.”
“Todas as vitórias ocultam uma abdicação.”
“Em todas as lágrimas, há uma esperança.”
“Se você viver tempo suficiente, verá que toda vitória se transforma em derrota.”
Notas
|1| O segundo sexo. Tradução de Sérgio Milliet.
|2| A força das coisas. Tradução de Maria Helena Franco Martins.
|3| O segundo sexo. Tradução de Sérgio Milliet.
Por Warley Souza
Professor de Literatura
Fonte: Brasil Escola - /literatura/simone-de-beauvoir.htm